Grupo Técnico de Trabalho avaliou a perícia do Exército Brasileiro que foi apresentada ao Supremo Tribunal Federal nesta sexta-feira (28)
O laudo pericial, após a análise de dezenas de mapas históricos, é categórico em afirmar que, na quase integralidade desses documentos, a divisa não decorre do divisor de águas (tese defendida pelo Estado autor – que, segundo o Exército, extrapola o próprio objeto da ação – mas da porção oeste da Serra da Ibiapaba (tese defendida pelo Ceará). Ou seja: a Serra da Ibiapaba é, segundo o laudo, historicamente, pertencente ao território cearense.
Especificamente, o perito concluiu em relação aos mapas históricos que “a representação da Serra da Ibiapaba, de seus elementos constituintes e circundantes, foi aprimorada ao longo do tempo por meio da utilização de novas tecnologias que surgiram com o passar dos anos. Contudo, devido a simplificações inerentes à escala, à representação iconográfica da Serra da Ibiapaba, à variação da posição relativa de feições, à variação da orientação e/ou forma de rios em relação à divisa e, à ausência da representação de algumas serras, morros e localidades, não há como definir uma linha exata entre os dois Estados. Porém, pode-se inferir que a linha de divisa representada na maior parte dos Mapas analisados não passa pelo divisor de águas e sim pela porção oeste da Serra da Ibiapaba” (tese defendida pelo estado do Ceará) – (citação entre aspas retirada da página 165 do laudo técnico).
O laudo pericial ainda afasta fundamentos centrais defendidos na Ação pelo Piauí. Quais sejam: a Convenção Arbitral de 1920 e a interpretação de que o Decreto Imperial nº 3.012/1880 definiu integralmente as divisas entre os dois Estados. Quanto ao Decreto Imperial, o relatório produzido pelo Exército Brasileiro, à luz do que consta dos Anais do Senado e da Câmara, ratifica o entendimento defendido pelo Estado do Ceará de que seu objeto era apenas a permuta dos territórios de Freguesia da Amarração (atual Luís Correia) e Príncipe Imperial (atual Crateús e Independência), e não a definição da divisa como um todo (tese defendida pelo Piauí).
Explicitamente, o Exército destaca que “Conforme interpretação deste Perito, considerando o que foi apresentado acerca das tratativas na Câmara dos Deputados em relação à redação do decreto, verifica-se que a intenção dos deputados à época era de definir os limites somente nas áreas citadas e não em toda a extensão da Serra da Ibiapaba” – (citação entre aspas retirada da página 182 do laudo técnico).
Em relação à Convenção Arbitral, aponta o Exército que o documento não possui validade legal, não servindo para o uso na perícia. Expressamente, o Exército concluiu em relação ao Convênio Arbitral que: “Não foi possível localizar o laudo produzido pelo árbitro, Dr. Washington Luiz, definindo a linha de limite entre os Estados. Desta forma, entende-se que os trabalhos referentes ao convênio não tiveram prosseguimento e, por conseguinte, o mesmo não foi homologado nas Assembleias Legislativas dos Estados. Sendo assim, os trabalhos não tiveram validade legal, segundo as regras estabelecidas pela Conferência Interestadual de Limites de 1920” – (citação entre aspas retirada da página 182 do laudo técnico).
O perito analisou, ainda, leis de limites municipais do estado do Ceará e do Piauí, constatando que a divisa entre os Estados corresponde àquela praticada pelo IBGE e defendida pelo Ceará. O Exército cita em seu laudo que “Em 12 de abril de 2017, pela Lei Estadual do Piauí nº 6.975, de 12 de abril de 2017, foi homologada a circunscrição territorial do Município de Buriti dos Montes. Em seu Parágrafo Único, fica definido que “o limite do Estado do Piauí com o Estado do Ceará é o que consta dos Mapas Municipais Estatísticos do IBGE, ano 2010”. Destaca-se que os limites representados pelo IBGE, referentes a 2007, usados na Lei Estadual nº 6.404, de 28 de agosto de 2013, conforme os dados do IBGE, coincidem com a representação dos limites estatísticos de 2010 do IBGE” – (citação entre aspas retirada da página 236 do laudo técnico).
O relatório técnico do Exército elencou cinco cenários relativos ao litígio a partir dos quesitos apresentados pelos Estados. A Possibilidade 01, adotando, a partir de quesito do Piauí, o critério do divisor de águas para definição da divisa entre os dois Estados; a Possibilidade 02, também atendendo a quesito do Piauí, distribuindo equitativamente as áreas de litígio entre os Estados; as Possibilidades 03 e 04, baseando-se respectivamente na divisa entre os Estados pelo lado oeste e leste da área de litígio; e a Possibilidade 05, seguindo a divisa censitária adotada pelo IBGE em 2022.
Com relação à Possibilidade 1, o Exército concluiu que: “O uso do divisor da Serra da Ibiapaba como linha de divisa estadual entre os Estados, Possibilidade 01, mostra ser a que mais afeta a atual divisão territorial existente, abrangendo uma área maior que as três Áreas de Litígio e tendo consequências em diversas áreas públicas e particulares do Estado do Ceará. Além disso, não encontra suporte na documentação histórica analisada, sendo o resultado de uma diferente interpretação unilateral do Decreto Imperial nº 3012, de 22 de outubro de 1880. Destaca-se, também, que essa possibilidade não considera a ocupação territorial ocorrida no desenvolvimento político, econômico e social das Áreas de Litígio e Regiões Complementares” – (citação entre aspas retirada da página 310 do laudo técnico).
Quanto à Possibilidade 2, conforme o relatório do Exército, a proposição de divisa igualitária das áreas de litígio, também elaborada por solicitação do Piauí, igualmente não encontra amparo na documentação histórica analisada e na situação atual observada in loco. É um critério unicamente territorial, que, assim como a Possibilidade 1, não considera a ocupação humana nem o desenvolvimento político, econômico e social das áreas de litígio. Especificamente, o perito conclui que: “Não foram encontrados mapas ou documentos históricos que amparem essa representação. Também não foi possível localizar acidentes naturais que a suportem” – (citação entre aspas retirada da página 310 do laudo técnico).
As Possibilidades 03 e 04, partem da premissa de que cada Estado seria o único detentor de todas as áreas do litígio. Conforme o Exército, essas possibilidades não atendem à documentação histórica analisada.
O Exército apresentou, por fim, a Possibilidade 5, elaborada a partir do critério da ocupação humana (IBGE), tese defendida pelo Estado do Ceará. Essa possibilidade se baseia na linha de divisa estadual conforme a ocupação das áreas de litígio, representada pelo limite censitário apresentado na base vetorial 2022 do IBGE e pelos dados levantados em campo pela equipe de perícia do Exército.
O perito destaca que “Essa possibilidade também leva em consideração a interpretação do Decreto Imperial nº 3.012, de 22 de outubro de 1880, conforme apresentada no capítulo 5 – Análise de Documentos Históricos, item 5.2 – Decreto Imperial nº 3.012, de 22 de outubro de 1880, na qual os limites descritos no referido decreto tratariam somente das áreas de permuta, na região da Comarca do Príncipe Imperial e da Freguesia da Amarração, conforme demonstrado na Figura 140” – (citação entre aspas retirada da página 300 do laudo técnico).
Para o perito, “a utilização da linha adotada pelo IBGE como delimitação dos setores censitários em 2022 na Possibilidade 05 não afeta a população e a distribuição das edificações dos Estados. Logo, entende-se que essa possibilidade é a que a menos afetaria os Estados atualmente, em termos populacionais e de edificações”. O Exército ainda destaca que “Essa possibilidade de divisa reflete a ocupação humana das áreas de litígio, com a criação das respectivas infraestruturas governamentais de assistência à população” – (citação entre aspas retirada da página 310 do laudo técnico)..
Ainda quanto à Possibilidade 5, salvo pequenos ajustes cartográficos em áreas pontuais próximas às divisas do IBGE, o Exército não aponta qualquer crítica em relação a essa solução para o litígio. Pelo contrário, extrai-se do laudo, ser esse o caminho de respeito à ocupação humana e às infraestruturas governamentais, o que está em consonância com a tese de pertencimento, defendida veementemente pelo Estado do Ceará desde o início.
A Procuradoria Geral do Estado do Ceará (PGE-CE) e o Grupo Técnico de Trabalho entendem que o resultado do laudo do Exército corrobora os argumentos e elementos apresentados pelo estado do Ceará, afastando os fundamentos principais da Ação movida pelo Estado do Piauí, reforçando a importância do aspecto humano como norte para a solução do litígio.
Entenda o caso
Em trâmite no Supremo Tribunal Federal (STF), a Ação Civil Originária que trata do litígio (ACO 1831/PI) foi movida pelo Estado do Piauí em 2011 e disputa parte dos territórios de 13 municípios cearenses: Granja, Viçosa do Ceará, Tianguá, Ubajara, Ibiapina, São Benedito, Carnaubal, Guaraciaba do Norte, Croatá, Ipueiras, Poranga, Ipaporanga e Crateús, abrangendo mais de 245 mil cearenses.
O Grupo de Trabalho que acompanha o litígio é coordenado pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE-CE) é composto por equipe multidisciplinar que conta com integrantes da Corregedoria-Geral do Estado (CGE), Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (Ipece), Instituto do Desenvolvimento Agrário do Ceará (Idace), Secretaria do Desenvolvimento Agrário (SDA), Secretaria do Meio Ambiente (Sema), Companhia de Gestão dos Recursos Hídricos (Cogerh) e Fundação Universidade Estadual do Ceará (Funece).
Ascom PGE - Texto
Creditec - Foto
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